terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Capítulo Dezesseis.

O teto de meu quarto, geralmente branco, não estava da mesma cor. Estava escuro. Cinza. Com as sombras das barras da janela e com o leve movimento da cortina.
Eu encarava este mesmo teto à, pelo menos, 2 horas.
Virei a cabeça para a direita, encarando a luminosidade vermelha do relógio. Quatro e meia da madrugada e minha consciência insistia em produzir pensamentos.
Pulei da cama. Ficar deitada naquele espaço amplo e frio me dava a maior sensação de vazio que já tive. Andando lentamente até a varanda, os pés descalços e silenciosos congelavam pouco a pouco.
O vento acabou comigo. Mordeu a pele de minhas bochechas, deixou-me com lágrima nos olhos, a dor de garganta parecia querer aparecer. Apertei os braços contra mim mesma, cruzando-os por cima do robe, e cheguei a sacada, apoiando-me no parapeito.
Vislumbrei uma Nova York sonolenta. Ainda havia carros correndo pelas ruas, semáforos que nunca paravam de funcionar. Pessoas, grupos de amigos, casais saindo de apartamentos em conjunto, rindo, andando trôpegos. Bêbados, mas felizes. Com grandes gargalhadas explodindo ao longo da rua.
Então eu pensei: será que se embebedar e fumar como uma chaminé arrancaria de mim sorrisos? Eu iria esquecer a solidão?
Deitei minha cabeça nos braços cruzados, fechando os olhos lentamente, substituindo as lágrimas de frio por quentes, verdadeiras, não causadas por nada a não ser emoção.
Quando meus olhos voltaram ao foque, jurei ter visto algo. Do outro lado da rua, olhando para minha sacada. Mais especificamente, para mim. Tudo bem, é normal em Nova York as pessoas pararem do nada e te encararem. Principalmente às quatro horas da manhã, onde quem ainda está na rua está bêbado ou drogado.
A pessoa estava sóbria, sim. Perfeitamente conhecida, mas o foque de meus olhos não eram o bastante para distinguir.
Alta, descabelados fios claros, olhos brilhantes, e um meio sorriso no meio de minha atordoada e sonolenta visão o fizeram virar-se de costa e voltar ao seu destino.
Meu cérebro sabia quem era.
E então eu estava vendo alucinações. Ou era uma sonâmbula. Ou eu estava sonhando ainda.
De repente, ouço passos contidos no corredor da sala. O molho de chaves pendia enquanto andava, estalando. Em seguida, a porta abriu e fechou, não tão bruscamente quanto eu estava acostumada a fazer.
Era minha mãe, com toda certeza. Mas eu nunca saberia o que ela fazia saindo às quatro da manhã de casa e nunca voltar. Talvez eu não quisesse descobrir.
Tivesse medo.
Bufei, e voltei minha atenção aos sorridentes grupos de amigos em bares.
É, talvez o álcool faça-me esquecer que a vida é do jeito que ela é.
Decidindo de última hora que não iria à escola de novo, vesti-me com o casaco e meu cachecol, evitando qualquer pensamento sobre o que eu estava fazendo.
Ao passar pelos mesmos passos de minha mãe, mergulhando pelas paredes desgastadas de minha casa – eu a considerava apenas minha –, com as mãos rapidamente ajeitando a chave na fechadura, encontro-me encarando a figura estranha, refletida no espelho cheio de falhas que devia estar ali à mais tempo do que eu estava.
A pálida face tinha leves olheiras em baixo do olhar cansado, injetado de sangue. Haviam marcas brilhantes nas bochechas, linhas que não seguiam padrões. Lágrimas.
Mas elas secam tão rápido...
Esfreguei as costas das mãos em minha face e destranquei a porta saindo, enquanto aquela grande maçã chamada Manhattan se divertia e ria de quem dormia.
De quem desistia.